quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Luciane Costa

"Acho interessante citar essa entrevista que a Kate Carew fez com o físico italiano Guglielmo Marconi para o The New York Tribune em 1912 por dois motivos que podem ser relacionados ao texto de Helena Chagas. O primeiro ponto é a necessidade da sedução em uma entrevista: Kate Carew possuía apenas cinco minutos para entrevistar Marconi, porém prendeu a atenção do entrevistado e levou a entrevista de uma forma que ela durou muito mais do que o planejado.

As perguntas em si não possuem nada de brilhante (por isso até nem as reproduzi aqui). São relacionadas à rotina do cientista, suas inspirações e os resultados de seu trabalho. O que chama atenção, porém, é como Kate Carew criou o contexto para entrevista. Um assunto a princípio tão pouco interessante rendeu um ótimo texto, capaz de conquistar o leitor até o final. Ela narra como foi o momento antes do encontro, como pensou as perguntas e de que modo viu seu entrevistado de uma maneira muito natural, sem medo de expor sua indecisão e receio sobre como conseguir as informações necessárias em tão pouco tempo. Além disso, ela constrói o texto usando termos relacionados à física para caracterizar o entrevistado e até mesmo a conversa, como: "Ele começou imediatamente a fazer linhas em ziguezagues, ondas no estilo Marcel – não, quero dizer hertziano.."

Entrevista de Guglielmo Marconi, inventor do telégrafo, a Kate Carew, para o The New York Tribune (14/04/1912)

Se para ser um gênio for preciso apenas ter uma paciência ilimitada, então, asseguro-lhes, meus caros, que o senhor Guglielmo Marconi não é o único a poder escrever OC (as iniciais que designavam o Grande Oficial condecorado pela Coroa Italiana) depois de seu nome ser mencionado em conversas corriqueiras como amigos de reis.

Por três dias – três, ah, muito longos dias – fiquei no jardim de espera da Holland House, comendo e dormindo, a intervalos fixos.

Ao final do terceiro dia, o secretário do senhor Marconi apareceu e me disse:

"Acho que posso conseguir logo a entrevista, mas você precisa me prometer que ela não vai durar mais do que quinze minutos."

Prometi, sem hesitar.

Pouco tempo depois ele retornou.

"Tenho que lhe pedir que não demore mais de dez minutos."

Prometi, hesitando um pouco.

Mais tarde: "Sinto muito, senhorita Carew, mas só posso conceder-lhe cinco minutos com o senhor Marconi. Ele está extremamente ocupado. Prometa-me que não ficará por mais tempo.".

"Oh, olhar para ele", eu sofria, "só uma olhada."

No caminho, o secretário me falou de seu divertimento com o blefe dos americanos que dizem viver sobrecarregados de trabalho. "Pois sim, eles fazem alarde e parecem encontrar tempo para tudo."

Enquanto isso imaginava: "O que posso dizer em cinco minutos?". Então lembrei-me de ter ouvido o trinado de uma jovem que fora apresentada ao senhor Caruso recentemente:

"Oh, senhor Caruso, o senhor canta maravilhosamente."

Pensei em dizer algo parecido como introdução.

"Oh, senhor Marconi, seu telégrafo sem fio é tão interessante."

Ele se curvaria em agradecimento como fez o senhor Caruso e eu poderia acrescentar:

"Ele faz uma grande diferença em nossas vidas domésticas."

Nessa hora o secretário estaria gesticulando pontos e hífens no ar freneticamente, e eu saberia que era a hora de terminar.

Na verdade, eu disse o seguinte, em resposta à minha mágoa:

"Foi um longo tempo, senhor Marconi, mas creio que a minha profissão é como a sua, ela requer muita paciência."

"Sim, certamente. Uma das primeiras coisas que um cientista precisa ter é paciência."

Conectamos nossos fios aos postes de pergunta e resposta e começamos a trocar mensagens.

...

Ainda existe algo da colegial em mim, porque simplesmente ignorei que um homem tão famoso e envolto em ações tão raras, que está mudando as forças elementares para o uso do homem e dando nome e residência a coisas não substanciais, teria uma aparência real – olhos escuros e luminosos, soltando contínuas faíscas, cabelos prematuramente brancos, embranquecidos pelas vigílias noturnas, o corpo, um mero motor humano, carregado de força psíquica, ascético, rarefeito.

...

O secretário passava de uma porta para outra. Ele me lançou um olhar, no qual li que ele me considerava o protótipo correspondente a Bramley. Não me importei. Não queria desconectar enquanto o senhor Marconi continuasse falando. Fingi ignorar a expressão magoada de fé destruída. Ah, esses secretários que sabem que sou uma enganadora. Se eles se reunissem para me julgar, meu estoque de palavra-de-honra não valeria o papel onde foi escrito.

...

Quando a infeliz palavra tempo foi mencionada, o secretário, como um gênio da lâmpada, apareceu de repente. Era fácil perceber que estava fora de seu amistoso limite de alcance. Ele enviou perigosos sinais pelo éter, e o senhor Marconi captou um impulso oscilante referente aos cinco minutos que eu havia prometido não exceder.

Minha mente, perfeitamente sintonizada, captou a freqüência do adeus. Levantei instintivamente e, enquanto apertávamos as mãos, a impressão que tive no início foi seguramente enfatizada, de que todas as coisas boas que os admiradores dizem sobre o senhor Marconi são verdadeiras.

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